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Pano do Pó

Para tirar as coisas a limpo,
mesmo nos cantos mais difíceis.


2003-12-25


 

O Plataninho feio - Um conto de Natal

Era verão e os dias estavam quentes quando as sementes foram deitadas à terra. Contentes e brincalhonas iam perguntando umas às outras o que achavam que iam ser quando crescessem.
- Eu vou ser uma alface!
- Eu vou ser um tomateiro.
- Eu vou ser um ramo de salsa.
- Eu vou ser um plátano!
- Eu vou ser um pé de.... Tu vais ser o quê!?!
- Eu vou ser um plátano!
Depois de alguns instantes para recuperar o espanto, voltaram a perguntar:
- Um quê?!
- Um plátano!
- O que é isso?
- É uma árvore, para ser mais exacto, o Plátano é uma árvore tipo das platanáceas de folhas largas e ramos compridos e frondosos. Vem do latim platanu e do grego plátanos. (Pelo menos essa é a definição do dicionário online da texto editora)

Passado o espanto, o sentimento foi de risada geral e de pura gozação com o pobre platanozinho. Afinal aquilo era uma estufa de produtos hortícolas, o mais certo era ele ser uma couve lombarda, agora um plátano....

E os dias foram passando e as plantinhas foram crescendo. Todos os dias as sementinhas perguntavam:
- Então, já sabes o que vais ser quando fores grande?
E a resposta era sempre a mesma: - Vou ser um plátano.
O resultado era também constante. Todos riam e faziam pouco daquela sementezinha que queria ser um plátano mas havia de crescer couve.

Os dias continuaram a passar e chegou o inverno. As sementes eram agora já plantas, mas não era por isso que deixavam de perguntar diariamente se a couvinha ainda queria ser um plátano. E a couve não desistia do seu sonho de ser um majestoso e imponente plátano. Assim, certo dia, resolveu escrever uma carta ao Pai Natal:

"Querido Pai Natal,

Eu sei que deves ter mais o que fazer do que ler cartas escritas por couves problemáticas. Acontece é que alguém aí em cima se deve ter enganado pois eu nunca me senti uma couve. Eu sei que nasci para ser um Plátano. Desde pequenina que eu sinto este apelo. Eu sei que o meu destino é ter crianças a brincar à sombra das minhas folhas ou servir de urinol para os cães da minha rua.
Mas nunca, nunca mesmo, senti vontade de ser comida de caldo verde com umas rodelas de chouriço. Já pensei ir para espanha e recorrer à cirurgia plástica, mas isto de ser couve e não ter pernas não ajuda em nada. Por isso, Pai Natal, peço-te: ouve este meu apelo e faz com que eu seja um plátano, nem que seja apenas por um dia, ou então ainda cometo uma loucura.

Obrigado, Pai Natal."


A couvinha lá enviou a carta ao Pai Natal e nesse dia passou pelas outras hortaliças da quinta com um sorriso cheio de confiança, convencido que um milagre ia acontecer e que aquele tinha sido o último dia que teriam feito pouco dela.

No outro dia logo de manhãzinha o Tomateiro, que era de todos o que mais gozava com a couve, foi ter ao seu canteiro e, de peito inchado, preparava-se para perguntar:
- Então, oh Hortêncio (Hortêncio era o nome da couve, penso que ainda não o tinha dito), já mudaste de... (!)
- Pessoal, o Hortêncio não está cá! - Disse alarmado o tomateiro, correndo a todos os canteiros das outras hortaliças.
- O quê? - Perguntaram os outros todos.
- O Hortêncio. A cama dele está vazia! Ele não está cá!
- Acham que se terá fartado de gozarmos com ele e se foi embora? - Perguntou a alface.
- Oh Aldegundes, às vezes és mesmo parva! Então não vês que o Hortêncio não tem pernas, como queres que ele se tenha ido embora? - Perguntou o tomateiro.
- Parvo é o sônhor, está bem? Por acaso o sônhor (a Aldegundes, além de um nome esquisito tinha também um problema de fala, sobretudo quando ficava irritada.*) tem pernas? Não, pois não? Então como é que explica o facto de ter ido ao canteiro do Hortêncio e depois ter vindo a correr avisar-nos que ele tinha desaparecido?
- Então não vês que isto é porque o gajo que está a escrever isto não bate bem da bola? Repara que esta história não faz sentido desde o início!
- Pois, realmente és capaz de ter razão.
- Então e o que vamos fazer em rôlação ao desaparôcimento do Hortêncio? - Perguntou a Aldegundes, que era a alface e que tinha um problema de fala.
- Olha, não sei. Não vamos fazer nada. A não ser a seguinte promessa: nunca mais iremos criticar ninguém, quaisquer que sejam as opções que resolva tomar na sua vida. Se apetecia ao Hortêncio ser um plátano nós deveríamos tê-lo apoiado.
- Isso mesmo! - Concordaram todos!



O que aconteceu ao Hortêncio na verdade não sabemos. O que é certo é que foi visto há dias em Coimbra, na Rua General Humberto Delgado, algures entre a TelePizza e o Rubyana um plátano que não era como os outros!





*Fiz questão de escrever esta nota para o caso de não terem reparado no problema de fala da Aldegundes, ou de pensarem que o facto de eu ter escrito "sônhor" fosse ignorância minha ou um erro de hortografia (no caso, é mesmo hortografia que se escreve, ou afinal isto não é uma fábula que fala de legumes?) Mas voltemos à história que esta pequena nota já vai longa e às tantas o leitor perde o fio à meada.

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