A sala
Abriu os olhos lentamente, a despertar de um sono profundo. Uma névoa na vista não o deixava distinguir os objectos à sua volta o que o deixou um pouco confuso.
Aos poucos, a visão tornou-se menos turva e quanto mais nitidamente via, maior a sua confusão. Mas que sítio era este em que estava? O que estava ali a fazer? Como fora lá parar?
Estava num quarto branco. Completamente branco, sem uma janela, sem um mínimo toque de outra cor. Apenas quatro paredes a formar um espaço cúbico, liso e apenas umas lâmpadas fluorescentes brancas colocadas no tecto quebravam a lisura do que o rodeava.. Ergueu-se ligeiramente e percebeu que estava numa cama de ferro, branca, coberto com um lençol, também ele branco.
Sentiu algo a prender-lhe o braço esquerdo e, para sua surpresa, viu um catéter introduzido na veia, ligado por um tubo plástico a um saco de soro pendurado sobre a cama. Afinal parecia estar num hospital.
Mas como teria ido ali parar? A última recordação que tinha era de se ter deitado na noite anterior. Não imaginava o que pudesse ter acontecido, nem quanto tempo teria decorrido.
Dois eléctrodos no peito e um num dedo da mão direita, ligavam-no por fios a um aparelho que emitia um regular beep-beep. Isso não o deixou particularmente confortado.
Excepção feita ao beep da máquina atrás de si, não se ouvia nenhum outro som. Gritou, chamou por alguém, mas não obteve resposta, apenas o beep-beep a quebrar o silêncio a intervalos regulares.
Tomou então consciência de uma dor aguda no peito e levando as mãos ao local, percebeu uma costura. Mas que raio se estaria a passar? Decidiu virar-se para trás e encarar a máquina dos irritantes beep-beep. O que viu fê-lo empalidecer tanto quanto as paredes do quarto. Uma linha de cor verde - a única cor no quarto todo - atravessava o monitor, mas a linha era plana! Olhou de novo e confirmou a pequena inscrição junto à linha ‘heart rate’... como era possível ele estar a ver a sua própria linha do coração plana? Isso significaria que estava morto! Não, não era possível. Mas... por outro lado, explicaria o absurdo da situação. Estaria ele numa sala do purgatório? Não, não podia ser.
Foi interrompido pelo som de passos... daquilo que antes parecia apenas uma parede branca, abriu-se uma porta e entrou um homem alto de meia-idade. Era magro, de rosto afilado e nariz aquilino, cabelo curto, escuro e penteado para trás com gel. Tinha uma roupa branca vestida, o que não causou estranheza. A visão de um estetoscópio ao pescoço trouxe-lhe um alívio indescritível, afinal era um médico.
- Sr Doutor, por favor, onde estou? Que se passou?
- Ah, vejo que já acordou, muito bem.
- Mas que se passou, onde estou eu? Porque estou aqui deitado e porque é que aquela máquina tem a minha linha cardíaca plana?
- Calma, calma - retorquiu o médico - uma coisa de cada vez. Você foi trazido para aqui de urgência, esta noite. Foi-lhe diagnosticado um problema grave no coração e teve que ser sujeito a uma intervenção cirúrgica.
- Ao coração? Mas... eu nunca sofri do coração... que se passou? Que tiveram que fazer?
- Infelizmente, tivemos que lho retirar... estava partido...