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Pano do Pó

Para tirar as coisas a limpo,
mesmo nos cantos mais difíceis.


2004-11-12


 

O homem sem passado (parte II)

Saiu do carro e olhou para trás, acabando por se encostar ao guarda lamas. Levou a mão ao bolso e procurou a caixa das cigarrilhas. Retirou uma e colocou-a na boca, enquanto procurava o isqueiro com a outra mão. O clarão do isqueiro iluminou a profunda escuridão daquele local e deixou-o sem ver nada os breves segundos que se seguiram. Começava a recuperar a visão, quando um silvo agudo e crescente lhe feriu os tímpanos e ainda não tinha chegado com os dedos aos ouvidos quando uma luz azul pálida o cegou por completo.

Acordou devagar e levou imediatamente a mão à nuca. Uma dor aguda e quase insuportável vinha da base do seu crâneo. Sentiu um alto sob a pele, mas o toque era-lhe de tal modo doloroso que desistiu. Sentia náuseas e estava a ponto de vomitar. Ainda por cima, um zumbido nos ouvidos não o deixava perceber os sons à sua volta. Encostou-se de novo, respirou fundo e tentou acalmar-se. Uns minutos depois aventurou-se a abrir os olhos. Era de dia e raios de sol quente rompiam por entre as copas das árvores. Sentiu o cheiro inconfundível da floresta. Ergueu-se lentamente e viu-se deitado no interior de uma floresta, a uma escassa dezena de metros da estrada, onde estava um Triumph Spitfire vermelho, com a porta do condutor semi-aberta.

O primeiro pensamento que lhe ocorreu foi de que o condutor do Triumph teria parado para o ajudar. Mas, ainda sentado, olhou em volta e percebeu que estava sozinho. Teve a estranha sensação de que se não havia ali ninguém, se estava ali um carro de porta aberta e ele estava no chão perto do carro... então o carro devia ser seu. Mas... ele nem gostava de carros antigos.

Olhou para si e ficou ainda mais confuso... o que fazia ele dentro de um fato cinzento? David sentiu que algo estranho se estava a passar consigo. Ergueu-se, finalmente e cambaleando foi até ao carro. A matrícula Alemã surprendeu-o e parou a olhar para o carro. Nesse momento escutou um motor a aproximar-se. Voltou-se e encarou uma pick-up com fardos de palha que se aproximava.

O seu aspecto terá chamado a atenção do condutor, que parou ao lado de David e abriu o vidro.

- Sind sie allright? Sie benötigen hilfe?

David não compreendeu, mas sentiu-se incapaz de falar. Acenou negativamente, forçou um sorriso e entrou para o carro. Esperou uns instantes que a pick-up se afastasse e rodou a chave na ignição, trazendo à vida o rouco quatro cilindros.

Arrancou, sem saber para onde ir, sem saber onde estava, sem saber quem era ou o que fazia naquele corpo que lhe parecia estranho. Olhou para o espelho retrovisor, apenas para perceber uma luz azulada que o seguia...

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