O fim de uma eraOntem vendi o meu carro.
Não, não foi nenhuma decisão filosófica de deixar de possuir veículo e passar a andar a pé ou de transportes. Era um carro mais velhinho que estava "empatado" desde que comprei o meu carro actual.
Mas vender este carro deixou-me subitamente nostálgico. Foi um carro que passou 9 anos nas minhas mãos e que me acompanhou ao longo de tanta coisa. Durante anos, este carro fez parte da minha personalidade e da representação que as pessoas tinham de mim. Aquele carro foi bólide de competição, autocarro, ninho de amor, discoteca, dormitório, camião de carga, planetário, templo de meditação, sugadouro de dinheiro, etc. Enfim, foi um companheiro. Aquele carro levou-me todo o Portugal e a Espanha e conheceu tantas pessoas que me marcaram.
Aquele carro tinha um rugir rouco de que já sinto falta. Aquele carro enrabou um Saxo porque eu ia cansado e me distraí.
Aquele carro tinha uma caixa lixada. Quando me diziam que o carro era uma merda porque não se conseguia conduzir, eu replicava que não, que era uma escola de condução. É um carro que precisa de jeito e carinho. Tinha uma caixa que dá todo um novo significado à palavra imprecisa e uma embraiagem que pegava tão alto que já ninguém acreditava que fosse pegar. Mas eu gostava. O que é fácil demais não dá gosto.
Aquele carro falhou-me menos do que eu lhe falhei a ele e agora vendo-o porque está velho e comprei outro mais novo e confortável. Aquele carro é uma coisa, um objecto, mas para mim vai ser sempre muito mais do que isso.