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Pano do Pó

Para tirar as coisas a limpo,
mesmo nos cantos mais difíceis.


2005-07-03


 

As pessoas más não morrem

Ou, pelo menos, parece que não uma vez que se referem sempre aos falecidos em termos elogiosos. Ou melhor, já que está morto, ao menos que não falemos mal dele.

curiosamente, esse "desconto" também se aplica aos familiares dos falecidos. Pessoas a quem nós já não dirigíamos palavra há meses ou anos passam subitamente a ser os nossos maiores amigos, de quem tínhamos tantas saudades e que, coitadinhos, eram quem menos merecia uma coisa destas. E depois, claro, temos que ser muito atenciosos e pacientes, porque perderam aqueles de quem mais gostavam.

E perguntam vocês: "Porque raio volto a este blog idiota se eles nunca postam nada de jeito?". Essa pergunta eu redirecciono ao departamento técnico responsável pelos cookies e spyware que infestam os vossos PCs. Para os que perguntaram: "Mas este gajo está-se a passar? Porque raio vem ele agora com esta conversa idiota e insensível?", passo a explicar.

Hoje fui visitar a viúva de um senhor que faleceu ontem para lhe apresentar os meus sentimentos/condolências. É uma senhora de quem eu nem sabia o nome (tal como não sabia o nome do marido que faleceu) mas que mora na aldeia dos meus pais, na rua do lado e, como os meus pais estão de férias na praia, a minha madrinha achou por bem convencer-me de que eu devia ir apresentar as condolências em nome dos meus pais. E, feito estúpido, acabei por aceder. Mal bato à porta, a senhora abre e começa a chorar e a gritar, abraçando-me (recordo que nem sequer sabia o nome dela e que ela me trata por "menino" desde os meus 3 anos porque também não sabe o meu nome). Depois de ela se acalmar (à custa de muitos "coragem" e "pronto, pronto"), decide contar-me como tudo se passou no dia fatídico (nomeadamente o que tinha comido ao jantar, uma dor de cabeça que lhe deu como que se fosse uma premonição, que tinha lavado as calças do marido, que tinham mudado o tapete da sala, etc, etc). Até aí, tudo (mais ou menos) bem. Morreu-lhe o marido, há que dar um desconto. Mas depois começa a falar da forma como os vizinhos lhe deram a notícia, de como ela já há muito tempo que queria que ele largasse aquele trabalho (o marido dela era um dos que morreu naquela fábrica de pirotecnia), de como os filhos são importantes para ela e eu a ver o tempo a passar. É que eu até tinha passado por lá quase à hora de almoço para ter a desculpa e para ver se a apanhava em má hora para aquilo ser rápido e nada.

E como é que se interrompe uma viúva? Não é fácil. Primeiro, porque esta viúva em particular não me dava sequer hipótese de dizer mais do que "É a vida", "Pois é, pois é" ou "Coragem". Segundo, porque nenhuma desculpa parece convincente ou suficientemente importante para abandonar uma viúva em pranto.

Mas aprendi a lição. Nunca mais vou a funerais ou dar as condolências a ninguém excepto familiares e amigos. Assim é muito desgastante.

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